Chineses põem US$ 70 bi nos Brics em maio

18/05/2015 0- Valor Econômico

Brasil e China assinam formalmente, durante a visita do primeiro-ministro Li Keqiang ao Brasil, que começa hoje, contratos de financiamento, investimentos e joint ventures de US$ 26 bilhões. Os chineses têm interesse em projetos que somam US$ 53,3 bilhões no país.

A China acelerou sua investida bilionária em maio. Após assinar acordos de US$ 25 bilhões com a Rússia, fez outros com a Índia, de US$ 22 bilhões, e deve repetir a dose com outro parceiro nos Brics, o Brasil. Se todas as intenções se concretizarem, o estoque de investimentos chineses no país dobrará.

Segundo informações do governo brasileiro, um pool de bancos deve anunciar financiamento à Petrobras, que, em abril, já contratou empréstimo de US$ 3,5 bilhões do China Development Bank, o BNDES chinês. Estavam sendo negociados acordos semelhantes com a Vale e Embraer. Os chineses preveem investir ou financiar, por meio da China Railway Construction Corporation e da China Railway Engineering até US$ 5,75 bilhões no trecho ferroviário que une Lucas do Rio Verde, (Mato Grosso) a Campinorte e Uruaçú, na ferrovia Norte-Sul.

O novo normal da China e o papel do Brasil

Por Sergio Leo

Os projetos de investimento que já têm assegurado o interesse de participação chinesa somam pelo menos US$ 53,3 bilhões, como revelado nesta coluna. Já os contratos de financiamento, investimento e joint ventures entre brasileiros e chineses a serem assinados formalmente durante a visita do premier chinês Li Keqiang, que começa hoje, estão por volta de US$ 26 bilhões, segundo informou a esta coluna o embaixador chinês no Brasil, Li Jinzhang, influente ex-vice-ministro de Relações Exteriores da China.

"Nossos dois países enfrentam o idêntico desafio de fazer ajustes em suas economias, por isso a cooperação sino-brasileira precisa adaptar-se", disse o embaixador, lembrando o que os chineses vêm chamando de "o novo normal" do país, com taxas mais baixas de crescimento, menos ênfase na exportação de bens e esforços para desenvolver o mercado consumidor interno. "A situação de demasiada dependência do comércio de commodities não podia continuar, e precisa ser transformada", comentou, ao falar da "nova etapa" da relação bilateral, em que investimentos mútuos devem ganhar dimensão inédita.

Li Jinzhang não confirmou o noticiado acordo para formação de um fundo de investimentos de US$ 50 bilhões, entre o ICBC chinês e a Caixa Econômica Federal. Mas adiantou que haverá vários acordos de apoio financeiro a serem firmados por bancos chineses, que enviaram seus presidentes na comitiva de Li Keqiang (pronuncia-se "Ketchiang"). O reforço da cooperação financeira bilateral, para financiar projetos nos dois países e atuar nas instituições multilaterais, é uma das prioridades dos dois governos para os próximos 40 anos, defende o embaixador.

"A parte chinesa está disposta a reforçar nossa coordenação e ajudar o Brasil a participar nos projetos de infraestrutura e comunicação da Ásia", garantiu Li Jinzhang, ao mencionar a adesão do Brasil ao Banco de Infraestrutura da Ásia, criado pelos chineses a contragosto dos Estados Unidos.

Segundo informações do governo brasileiro, um pool de bancos deve anunciar financiamento bilionário à Petrobras - que, em abril, já contratou financiamento de US$ 3,5 bilhões do China Development Bank, o BNDES deles. Estavam sendo negociados acordos semelhantes com a Vale e Embraer.

Visto com desconfiança ou desinteresse por investidores ocidentais e assediado com sugestões de reformas por governos de países desenvolvidos, o Brasil governado por Dilma Rousseff abraça com interesse o abastado gigante chinês, que, como define o presidente emérito do Conselho Empresarial China-Brasil, Sérgio Amaral, tem, na visita de Li Keqiang, mais um ato de sua nova "geopolítica da infraestrutura".

A China, segundo Amaral, parece ver na América do Sul oportunidade de replicar o que faz na Ásia, onde os chineses expandem influência promovendo e financiando a chamada "nova rota da seda", que conectará a China à Europa, passando pela Ásia Central, e ao Oceano Índico, passando pela Tailândia com um trem de alta velocidade.

Li Keqiang deve assistir, ainda, a assinatura de dois protocolos que, afinal, liberarão a entrada de carne in natura brasileira na China e definirão uma lista de frigoríficos com "fast track" para habilitação pelas autoridades sanitárias. Também se prevê a oficialização da compra de 22 aviões da Embraer, modelo E-190, na versão mais moderna. Mas o ponto alto da visita, para o embaixador chinês, é o acordo de "desenvolvimento e capacidade produtiva", aproveitando a experiência chinesa em áreas como mineração, logística, portos, energia e infraestrutura em geral.

"A China dispõe de tecnologia avançada, ricas experiências e financiamento, na área de infraestrutura, sobretudo em ferrovias", exemplifica o embaixador. É evidente o interesse chinês em avançar com a ferrovia transoceânica, que ligará o litoral Atlântico brasileiro aos portos do Peru, no Pacífico. Na lista de "colheita antecipada" possível para os negócios bilaterais, os chineses preveem investir ou financiar, por meio da China Railway Construction Corporation e da China Railway Engineering Corporation até US$ 5,75 bilhões no trecho ferroviário que une Lucas do Rio Verde, no centro de Mato Grosso, a Campinorte e Uruaçú, na ferrovia Norte-Sul.

Os interesses chineses em infraestrutura no Brasil incluem até o possível investimento de até US$ 1,2 bilhão, pela China State Construction Engineering, no projeto de criação de uma "cidade logística" em Pindamonhagaba, São Paulo. O China Engineering Group mantém conversas com a empresa paulista Isoterma Construções Técnicas para um ambicioso plano de abastecimento de água em São Paulo, que demandaria investimentos de US$ 2,7 bilhões, também incluído na lista de interesses dos chineses.

O embaixador Li Jinzhang não entra em detalhes sobre os projetos, mas reafirma o interesse da China em projetos, no Brasil, para energia hidrelétrica, solar e até nuclear. No setor de energia, os principais atores serão a Corporação Três Gargantas (CTCG) e a Power Construction Corporation of China (PCCC).

Sérgio Amaral vê, no interesse da China, uma oportunidade para o Brasil substituir as construtoras envolvidas em projetos hoje ameaçados pelo envolvimento de grandes empreiteiras brasileiras nos escândalos de corrupção. Os chineses podem dar o fôlego necessário a firmas brasileiras de menor porte, para que assumam obras em perigo, sugere.

Os termos, condições e dinheiro de fato envolvidos nos promissores acenos dos chineses começam a ficar mais claros a partir de amanhã, quando Li Keqiang, desembaraçado líder chinês com grande poder nas decisões econômicas do país, exibir o que trouxe na bagagem em sua visita ao Brasil. Uma visita que, aliás, é apenas a primeira parada de uma viagem cheia de simbolismo por uma coleção de capitais sul-americanas.

Sergio Leo é jornalista e especialista em relações internacionais pela UnB. É autor do livro "Ascensão e Queda do Império X", lançado em 2014.