Construção de ferrovia causa rombo de R$ 2 bi, diz TCU

09/01/2013 - Valor Econômico

A construção da Fiol, que ligará o sertão baiano ao litoral do Estado, pressupõe, na ponta dos 1.000 km de trilhos, um porto para o escoamento da carga.

Falta de planejamento e falhas na execução de dois megaprojetos de infraestrututura na Bahia - a Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol) e o Porto Sul, complexo portuário de Ilhéus - trarão um desperdício de R$ 2 bilhões em recursos públicos. A construção da Fiol, que ligará o sertão baiano ao litoral do Estado, pressupõe, na ponta dos 1.000 km de trilhos, um porto para o escoamento da carga. Mas a ferrovia deverá ficar pronta em dezembro de 2015, três anos e meio a quatro anos antes da conclusão prevista do complexo Porto Sul, em junho de 2018, e ficará todo esse tempo sem utilização - ou com nível de operação desprezível.

O Tribunal de Contas da União (TCU) auditou os projetos e calculou o prejuízo que será imputado à União por conta do descompasso nas obras. Ao todo, as perdas somam R$ 1,996 bilhão, cifra que inclui a receita cessante (lucro que a ferrovia deixará de gerar no período) e os custos do capital imobilizado, que embutem a depreciação dos ativos, os gastos com manutenção e o custo de oportunidade atrelado ao que foi investido na malha. Esse prejuízo pode ser ainda maior, já que o TCU considerou apenas os investimentos feitos na construção da estrada de ferro.



Um rombo de R$ 2 bilhões. Esse é o tamanho aproximado do estrago que será causado aos cofres públicos por conta de falta de planejamento e de uma enxurrada de falhas cometidas na execução de dois megaprojetos de infraestrutura na Bahia: a Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol) e o Porto Sul, complexo portuário previsto para ser erguido em Ilhéus. A origem desse prejuízo bilionário está no cronograma dos estudos e das obras dos dois empreendimentos, ações que foram realizadas sem nenhum tipo de integração, embora a construção da Fiol, que ligará o sertão baiano até o litoral do Estado, só faça sentido se, na ponta dessa malha de 1 mil km de trilhos, existir um porto para concluir o escoamento da carga.

Listada no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), a Fiol é administrada pela estatal Valec. A ferrovia, que receberá investimentos de R$ 4,334 bilhões, tem previsão de ter seus primeiros 500 km concluídos em junho de 2014, com a ligação de Ilhéus a Caetité. Uma segunda metade de 500 km está prevista para dezembro de 2015, com a extensão de Caetité até a cidade de Barreiras. Acontece que a conclusão do complexo Porto Sul, que até novembro de 2012 sequer tinha o seu local de instalação definido no litoral baiano, só deverá ocorrer daqui a 54 meses, ou seja, em junho de 2018. Isso significa que a Fiol, depois de concluída, ficará sem utilização - ou com nível de operação desprezível - por um período entre três anos e meio e quatro anos.

O descolamento entre os dois empreendimentos chamou a atenção do Tribunal de Contas da União (TCU), que auditou os projetos e calculou o prejuízo que será imputado à União por conta do descompasso nas obras. Ao todo, as perdas somam R$ 1,996 bilhão, cifra que inclui a receita cessante (lucro que a ferrovia deixará de gerar no período) e os custos do capital imobilizado, que embutem a depreciação dos ativos, os gastos com manutenção e o custo de oportunidade atrelado ao que foi investido na malha. Esse prejuízo pode ser ainda maior, já que o TCU se limitou a considerar apenas os investimentos feitos na construção da estrada de ferro, sem contabilizar outros custos atrelados ao projeto, como a sinalização os próprios trens que circularão na via.

"Após dois anos da contratação das obras da Fiol, o trecho que iria conectar a ferrovia ao complexo portuário ainda encontrava-se indefinido", conclui a auditoria do tribunal. "Foi possível constatar que a implantação e gestão dos dois projetos de infraestrutura apresentam relevantes deficiências, resultantes de seu planejamento não devidamente integrado e coordenado."

O planejamento da Fiol teve início em 2008. Para defender a viabilidade do projeto, o governo destacou que a ferrovia serviria para integrar as áreas produtivas das regiões Norte, Centro-Oeste e Nordeste do país, uma vez que sua malha deverá se ligar à Ferrovia Norte-Sul, também sob responsabilidade da Valec. Ocorre que, atualmente, os últimos 500 km de malha que ligariam a Fiol até a Norte-Sul, entre as cidades de Barreiras e Figueirópolis, no Tocantins, sequer têm data para serem iniciados. Não há, até o momento, nenhuma previsão quanto à conclusão dos estudos necessários para a definição desse traçado.

Quanto ao Porto Sul, que tem investimentos estimados em R$ 3,5 bilhões, o Ibama só concedeu a licença prévia ambiental do projeto em novembro. A expectativa é que a licença de instalação que dará aval para o início efetivo das obras do complexo portuário saia nos próximos seis meses, prazo que já foi considerado pelo TCU para calcular os prejuízos relacionados ao descolamento do cronograma do porto com a ferrovia baiana.

O fato é que, nos últimos três anos, enquanto o Porto Sul enfrentava uma série de obstáculos ambientais para se viabilizar, a Valec já tocava as obras da Fiol. Nesse meio tempo, o porto, idealizado para ser situado na praia de Ponta da Tulha, chegou ater seu licenciamento negado pelo Ibama em 2010. Foi preciso buscar uma segunda alternativa para instalação, em Aritaguá, para que o licenciamento ambiental avançasse.

A principal vocação da Fiol é o transporte de minério. Em Caetité estão as minas da Bahia Mineração (Bamin). O projeto da empresa prevê que 19,5 milhões de toneladas de minério de ferro sejam transportados por ano até o Porto Sul. Numa segunda fase, mais 45 milhões de toneladas anuais deverão ser carregadas pelos trilhos da Fiol e embarcadas em navios ancorados em seu terminal, em Ilhéus. A Bamin, que terá capacidade de movimentar diariamente 62,1 mil toneladas de minério de ferro, pretende iniciar sua exploração em 2014.

Para o ministro-substituto do TCU André Luís de Carvalho, toda cúpula dos Transportes falhou na execução dos empreendimentos. "O Ministério dos Transportes não atuou para evitar o início da execução das obras da Fiol sem que houvesse uma garantia mínima da viabilidade ambiental do complexo Porto Sul, sendo este empreendimento imprescindível para a viabilidade técnica e econômica da ferrovia ", comentou. No caso da Valec, disse Carvalho, "restou evidenciado que a empresa tomou decisões relativas à implantação da ferrovia de forma fragmentada, sem levar em consideração que o planejamento de um conjunto de obras civis com essas características deve envolver, necessariamente, a análise de viabilidade da integração dos sistemas viários e de suas modalidades de transporte".

Fonte: Por André Borges - Valor Econômico