TAV terá licitação internacional

06/07/2012 - Valor Econômico

Depois de passar um bom tempo no limbo, o projeto do trem de alta velocidade (TAV) foi efetivamente retomado pelo governo. Até o fim deste ano, apurou o Valor, a estatal Etav, criada recentemente para coordenar o empreendimento, fará uma licitação internacional para contratar a empresa ou consórcio que assumirá a elaboração do projeto executivo de engenharia do trem-bala. A decisão de promover uma concorrência internacional deve-se ao fato de o Brasil não ter mão de obra especializada nesse tipo de projeto. A expectativa do governo é que empresas nacionais associem-se a companhias estrangeiras de engenharia para disputar a licitação.

O estudo que ajudará a aprofundar questões técnicas e a afastar dúvidas sobre a viabilidade do trem planejado para ligar Rio, São Paulo e Campinas deverá demorar ao menos um ano para ser concluído. As estimativas preliminares apontam que o projeto de engenharia custará cerca de R$ 540 milhões, uma conta que será paga com recursos da Etav.

Com a entrada em cena da nova estatal, ficará a cargo da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) a realização dos dois leilões para contratar os consórcios que assumirão a obra. O Valor apurou que o primeiro edital - que prevê a contratação do operador do trem e da tecnologia que irá suportar o projeto - já está pronto e aguarda apenas um sinal verde do Ministério dos Transportes para que seja divulgado e submetido a consulta pública. Há expectativa que essa publicação possa ocorrer ainda neste mês. Feita a consulta, que deverá durar ao menos 45 dias, a ANTT irá analisar as sugestões, para então divulgar um texto definitivo. A realização do leilão, no entanto, só poderá ocorrer seis meses após essa divulgação. Esse prazo será dado para que as empresas interessadas no empreendimento tirem suas dúvidas e formulem propostas. A falta de tempo para analisar o projeto foi o principal argumento apresentado pelas empresas para desistirem de tentativas anteriores de licitar a obra. Na prática, o novo cronograma faz com que a primeira licitação do TAV, então planejada para ocorrer até o fim deste ano, seja feita somente no segundo trimestre de 2013, isto é, praticamente daqui a um ano.

Para não perder mais tempo, a Etav quer fazer a contratação do projeto executivo antecipadamente, adiantando os estudos até onde for possível, enquanto não acontece o leilão que definirá o gestor e a tecnologia que será utilizada no empreendimento.

São remotas, portanto, as chances de a ANTT realizar, ainda no ano que vem, o segundo leilão do trem-bala, para escolher o consórcio que cuidará da construção de toda a infraestrutura que suportará o TAV. Isso ocorre porque, para publicar esse segundo edital, a agência precisa ter nas mãos o projeto executivo pronto. Paralelamente, também terá que obter a licença ambiental prévia do empreendimento, que é concedida pelo Ibama. O órgão ambiental já assinou um termo de referência com a ANTT, liberando ações preliminares para viabilizar o licenciamento da obra. Um grupo de empresas de consultoria foi contratado pela agência e trabalha em levantamentos de flora, fauna e impacto urbanístico, além de patrimônio histórico e arqueológico.

A Etav, conforme anunciado pelo governo, vai ser liderada por Bernardo Figueiredo. Ex-diretor geral da ANTT, Bernardo foi convidado para assumir o posto pelo ministro dos Transportes, Paulo Passos. O Valor apurou que a diretoria da estatal também terá a participação de Helio Mauro França, que atualmente ocupa a superintendência da agência reguladora e que participa do projeto desde o início.

Pelo plano do governo, a Etav terá uma participação de aproximadamente 10% em todo o empreendimento. Há possibilidade dessa fatia ser ampliada, mas essa hipótese não é avaliada pelo Ministério dos Transportes neste momento. Além de financiar os custos com projeto executivo, a estatal vai bancar os gastos socioambientais e de desapropriação da obra, os quais estão estimados em R$ 3 bilhões.

Depois de reformular todo o edital do projeto, que passou por três tentativas frustradas de leilão, o governo mexeu nas regras de remuneração para atrair a iniciativa privada. Pelo novo modelo, a taxa de retorno do projeto como um todo foi calculada em 6,32%. Esse índice está próximo dos 6,46% estabelecidos para o leilão dos aeroportos e abaixo dos 8% definidos nas concessões de rodovias federais. A remuneração sobre o capital próprio investido pelos acionistas ficou em 11,7% anuais. O financiamento público do projeto, que é liderado pelo BNDES, atingirá cerca de R$ 22 bilhões. O contrato de concessão do TAV terá duração de 40 anos. Pelas regras já conhecidas, o tempo da viagem expressa (sem paradas intermediárias) entre Rio e São Paulo deverá ser de até 99 minutos.

Com o projeto executivo, o governo quer responder, de uma vez por todas, questões básicas, como o preço da obra e a demanda projetada. As estimativas para a construção do trem-bala variam de R$ 34 bilhões, valor defendido pelo governo até o ano passado, até mais de R$ 50 bilhões, conforme cálculos apresentados pelas empreiteiras interessadas em tocar as obras.

O levantamento técnico também vai sinalizar o potencial financeiro atrelado à exploração imobiliária ao longo dos 511 quilômetros do traçado. A intenção do governo é demonstrar para cada consórcio qual o valor estimado para o arrendamento da infraestrutura e, principalmente, qual é o potencial imobiliário do empreendimento. O modelo prevê que a exploração comercial das estações do trem-bala, como a oferta de hotéis, apartamentos e lojas, entre outros, fique nas mãos do consórcio de empreiteiras que construirá a infraestrutura do projeto.

O governo sinaliza que franceses (representados pela Alstom), alemães (Siemens), japoneses (Hitachi, Mitsubishi e Toshiba) e coreanos (Hyundai e Samsung) continuam interessados no empreendimento.

A retomada do trem-bala e a discussão de um cronograma mais preciso da obra deverá ser tema de uma reunião marcada para a próxima segunda-feira, entre os ministérios dos Transportes, Planejamento e Casa Civil. O TAV, que no mais recente balanço do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) foi carimbado com obra em ritmo "adequado", foi idealizado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para rodar em 2014, ano da Copa do Mundo.